É possível produzir sem agredir e alimentar sem devastar. A natureza tem as respostas que procuramos, o nosso papel é encontrá-las.

DESPEJO ZERO NOS SISTEMAS DA NATUREZA

DESPEJO  ZERO 
NOS SISTEMAS DA NATUREZA

 Quem nunca se colocou na função de um biólogo? Estudar o comportamento das espécies, levantar informações em campo, realizar análises laboratoriais, etc. Há alguns anos, a profissão de biólogo era sinônimo de carreira difícil, mal remunerada e pobre em oportunidades. “Ah, você cursa biologia? É professor?” Ou um profissional de campo, que passa temporadas no meio da floresta, analisando o meio ambiente. A verdade é que alguns segmentos da indústria intensificaram suas pesquisas em sistemas naturais na a concepção de seus produtos, abrindo novos postos estratégicos para biólogos, em equipes de desenvolvimento de produtos.  
   O ato de copiar os modelos da natureza, ou se inspirar nestes modelos, foi o que deu origem ao termo biomimética, tradução de biomimicry, consagrado com o lançamento do livro de Janine Benius, em 1997, que traz uma série de exemplos e tecnologias inspirados pela natureza. Janine faz uma abordagem aos sistemas de cultivos baseados em diversidade. A autora também contextualiza os meios de caaptação e de transferência de energia utilizado na natureza, fazendo uma relação com a eficiência produtiva de baixo consumo de energia e despejo zero. A obra também aborda o poder de cura das plantas e também associa a dinâmica dos mercados com o funcionamento das florestas. Em resumo, o livro resgata a conexão que o ser humano perdeu com a natureza e com a sua própria origem.
   A natureza é sábia na criação de “mecanismos de alta-tecnologia”. Considerando que o desperdício é uma ineficiência do processo produtivo, a natureza detém os métodos mais eficazes de produção, sem emitir resíduos que não possam rapidamente ser re-absorvidos. Toda a energia utilizada na natureza é gerada pela luz solar. As plantas são responsáveis pela captação e distribuição da energia ao longo da cadeia alimentar. Isto não é novidade para ninguém. Seria possível o homem viver apenas com a energia solar? Parece pouco provável, porém não impossível.


    Existem indícios do consumo do petróleo que datam 4.000 ac. O óleo é o responsável pela maior indústria do planeta e a humanidade depende dele para sobreviver, uma dependência criada por ela mesma.  Com direitos de extração e refino centralizado nas mãos dos estados, o petróleo foi responsável pelo desenvolvimento econômico e geração de renda em diversos setores desde o final do século XIX. Porém é cada vez mais evidente que o seu consumo não é adequado. Além de permitir a concentração da riqueza, o petróleo é o maior responsável pela contaminação do ar, da terra e do mar - principalmente quando ocorrem os desastres (1). Em longo prazo, os custos referentes ao uso deste óleo são muito superiores ao de sua capacidade de geração de riqueza. Além disso, são desconhecidos os efeitos da extração e consumo deste rico óleo que, sem duvida nenhuma, possui um papel fundamental na formação geológica do planeta e, supostamente, deveria permanecer em seu local de origem.

   
  A indústria da construção civil, assim como a indústria petroquímica, está entre os principais vilões na preservação do planeta. Qualquer obra, por menor que seja, representa altíssimos impactos na natureza. Com um pouco de estudo é possível mitigar estes efeitos e, sem dúvida, até eliminá-los. A simples observação da natureza tem servido de base no desenvolvimento de construções “regenerativas” ou “auto-suficientes”. Avaliando a harmonia encontrada nas florestas, alguns engenheiros e arquitetos estão desenvolvendo sistemas que permitem a captação da energia solar e da água das chuvas, evitando o desperdício destes recursos. Hoje existem modelos bem sucedidos de grandes projetos que utilizam sistemas de ar-condicionado sem consumo de energia elétrica, apenas por troca de calor. O projeto Green Zone (2), por exemplo, é um modelo de sucesso no mundo inteiro. Ele foi desenvolvido com uma visão holística prevendo a conservação dos recursos naturais por meio de construções adaptadas, sem comprometer a função ou o conforto dos estabelecimentos envolvidos. Essa abordagem abrangente tem caracterizado o projeto desde o início, desde as fases de concepção e construção. O complexo Green Zone é formado por escritórios comerciais, uma concessionária Ford e uma loja da rede McDonald's.
  Voltando aos sistemas naturais, as moléculas de água e gás carbônico são absorvidas pelas plantas, junto com outras nutrientes essências, que ao receberem o calor do sol são transformados em carboidrato e oxigênio através da fotossíntese, insetos e outros seres pequenos se alimentam destas plantas e respiram o oxigênio produzido por elas, armazenando energia e servindo de alimento aos níveis superiores da cadeia alimentar. Pense em um animal qualquer em seu habitat natural como a Mata Atlântica, por exemplo. Você consegue enxergar a continuidade da vida sem a presença do homem? A natureza tem totais condições de persistir sem que o homem interfira. As plantas se multiplicam espalhando sementes e consumindo os nutrientes da terra e da água. A matéria orgânica, em seu fim da vida, deixada como resíduo pelas plantas ou animais, serve de nutrientes para o solo. Qualquer ciclo na natureza tem inicio meio e fim. Tudo o que é produzido é criteriosamente “pensado” em sua concepção para que não seja gerado nada a mais que não possa ser rapidamente reaproveitado.  
  Aprofundando em inovações, biotecnologia está permitindo enxergar níveis de eficiência muito superiores na natureza e, ao mesmo tempo, redesenhá-los de forma milimétrica. Além de zero desperdício, a natureza produz muito mais com muito menos. Para ilustrar podemos tomar como exemplo a teia de aranha, muito mais resistente que muitos tecidos, consome uma pequena quantidade de energia em sua produção. Também a pérola, que possui resistência superior a melhor cerâmica técnica desenvolvida pelo homem, é produzida sem a necessidade de uma complexa linha industrial.
  Diante do princípio de zero despejo e eficiência máxima, a natureza não apenas serve como modelo de inspiração, mas também como provedora de recursos. A Synthetic Genomics, por exemplo, desenvolveu a tecnologia para a produção de biocombustíveis através da criação de algas. O estudo da biologia nuclear permitiu a criação células que secretam óleo de forma contínua, facilitando a produção de combustíveis e de outros produtos químicos em escala industrial. ‎"Acreditamos que os melhores exemplos de tecnologias inovadoras que poderiam mudar o nosso futuro estão contidos nos novos domínios da biologia sintética..., este campo pode mudar a maneira como pensamos sobre a vida, mostrando que podemos usar os sistemas vivos para aumentar nossas chances de sobrevivência" como colocou J. Craig Venter, fundador da empresa.
   A biomimética, a biotecnologia ou a engenharia genética são campos novos na ciência, com cerca de 20 anos de vida e imensurável potencial de desenvolvimento. São ainda responsáveis por poucas contribuições para a vida terrestre, o que nos leva a entender que estão no berço de seu desenvolvimento.  É estranho ouvir da boca de especialistas que “despejo zero” trata-se de uma utopia. É como desistir de um objetivo pouco explorado. Seria sensato afirmar que a humanidade ainda desconhece níveis ótimos de eficiência e que, desta forma, não conseguiu ainda desenvolver tecnologias que eliminem os resíduos em sua totalidade.
   Não sei se este é o melhor exemplo - um pouco estranho ver uma planta encapsulada - mas trata-se de uma forma muito clara de entender os serviços prestados pela natureza e como dependemos dela para sobreviver. Bastaria então não deixarmos de lado o fato de sermos frutos desta natureza e entendermos que ela está acima de nós. Se assim for, poderemos então conviver em harmonia com o meio e tirar inúmeras vantagens para melhorar nossas e outras vidas com as quais coexistimos.





(1) Há poucos dias atrás a ExxonMobil foi as mídias como responsável pela contaminação do rio Yellowstone. Mais recente o vazamento anunciado em uma aera de reserva florestal em Montana, pela empresa FX Energy Inc. A BP também esteve nas mídias internacionais por novos vazamentos, após o maior vazamento da história, no Golfo do México. Tais acidentes são comuns ao ponto de não serem mais crucificados pela sociedade. http://inhabitat.com/new-oil-spill-found-in-montana-350-miles-from-yellowstone-spill/


(2) Para maiores detalhes do projeto acesse a versão em Inglês disponível em http://www.greenzone.nu/index_e.shtml ou no site do arquiteto Anders Nyquist http://www.ecocycledesign.com.

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